As Fardas Negras são postulantes à Princípes e as Fardas Verde Oliva, Reis

A demissão recém concretizada de Sérgio Moro concretiza uma vitória inevitável do Partido Fardado contra outro Partido que postulou o trono de Príncipe no governo: o Partido da Lava Jato, mas, principalmente, dentro dele, a Polícia Federal. Os fardas negras da PF, embora civis, foram turbinados nos últimos governos com injeções de dinheiro (inclusive dinheiro estrangeiro [1]) em efetivo, equipamentos, viaturas, barcos helicópteros etc, e, também, conquistaram importante autonomia funcional, servindo como uma das mais importantes instituições de combate ao crime em nível nacional e internacional, capacidade de investigação e centro de produção de inteligência e contra inteligência.

Essa autonomia e o poder infraestrutural lhe insularam dentro do Estado, tornando-a sedenta por mais poder. Ganharam muito prestígio com as operações-relações públicas das grandes TVs durante a Operação Lava Jato, onde sua atuação era coberta diariamente em horário nobre e até séries da Netflix foram feitas. Esse soft power da corporação dentro do Estado ficou demonstrado, por exemplo, num generoso concurso com mais de mil vagas realizado em 2018/19, tendo sido o único deste tamanho realizado pela União nesses anos de austeridade permanente, além de terem sido um dos únicos servidores federais que receberam aumento de salário esses últimos anos.

Mas voltemos ao foco do texto. A Polícia Federal era não apenas uma instituição de Estado queridinha da mídia e do fã clube militante de classe média, apoiada por políticos (inclusive e principalmente os de esquerda). A PF era o braço armado do PLJ, altamente estratégica, era uma corporação que aspirava (ainda aspira) ao trono de Príncipe. Passou a disputar o mesmo nicho de poder que seu pai, o Exército. E enquanto os verde oliva tem Mourão, Braga Neto, Fernando Azevedo, Bolsonaro como um peão num jogo de xadrez (poderá ser descartado pra garantir o avanço da rainha e do rei), e diversos outros cavalos, os fardas negras tinham em Moro sua mola de alavancagem principal dentro do Poder Executivo. Ambos disputavam objetivamente o mesmo trono, o problema é que são dois duelantes e só há um trono.

Nesse sentido, a demissão de Moro, de um ponto de vista estratégico, é um movimento de poder e um recado do Exercito pra Polícia Federal, pra mostrar quem é o Rei e quem é o Príncipe da jogada. O desgaste que Bolsonaro poderá sofrer caso o novo diretor da PF investigue seus filhos será apenas mais uma manifestação da função que Bolsonaro cumpre no tabuleiro do poder.

Hoje o presidente, do ponto de vista dos militares, é um escudo para eles, os reais jogadores no poder, porque todos os erros políticos recaem sobre ele. Quando ele não for mais necessário, terá um manancial de crimes pelo qual poderá ser julgado pra ser afastado, e, nesse sentido, a investigação do Flávio Bolsonaro já não é mais tão central na definição do poder. Moro, por sua vez, não soube jogar o jogo do poder. Se aliou a Bolsonaro como fiador de seu projeto de poder inscrito na legenda do PLJ, buscou se portar como fiel escudeiro, num primeiro momento, para através disso ganhar poder infraestrutural sobre PF e demais órgãos do judiciário. Foi enfraquecido por um golpe vindo de onde menos se esperava: a imprensa alternativa liberal de esquerda. Tornou-se recluso e, paulatinamente, foi ganhando menos exposição pública do que se imaginava que teria, terminando hoje definitivamente sua passagem como membro da coalizão de direita no poder.

E, contudo, não seria razoável afirmar que Moro, PF e partido da Lava Jato sejam cartas fora da jogada, eles só estão sendo “colocados no seu devido lugar”, isto é, sócios minoritários das Forças Armadas, compartilhando de forma subalterna o comando do poder. Faltou à PF escolas de Comando, médicos, quadros burocráticos e profissionais em geral que podem ser mobilizados para prestação de serviços públicos e consecução de políticas públicas. Isto é, todo um aparato organizativo, ideológico e infraestrutural, de caráter secular, que o Exército possui para além dos fuzis, e que lhes garante capacidade de exercer poder. Nesta partida, o time verde oliva é favorito e está confirmando seu favoritismo contra o time de farda negra.

[1] Polícia Federal brasileira recebe mensalão do governo dos Estados Unidos.


Texto escrito por Ariel Franco, jornalista graduado pela UFG.

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