Texto originalmente publicado no livro “A Prática Revolucionária. Unidade e Luta II. Obras Escolhidas: Textos coordenados por Mário de Andrade.” Lançado em 1977.
Transcrição de Andrey Santiago.
Foram feitas leves alterações para o português brasileiro.
Na fase atual da nossa luta e para reforçar a nossa organização diante das grandes responsabilidades que tem, não basta pôr em funcionamento todos os organismos dirigentes do Partido, não basta fazer bom trabalho político e agir eficazmente, vitoriosamente, sobre o plano militar. Para que o Partido seja cada dia melhor e esteja à altura das suas responsabilidades, é indispensável aplicar em todos os escalões da nossa vida e da nossa luta os princípios de organização e de trabalho que o Partido adotou como normas fundamentais da sua ação. Tal é o caso do princípio da crítica e da autocrítica para resolver os problemas e contradições internas, do princípio da direção coletiva na direção da vida do Partido, do princípio do centralismo democrático e da democracia revolucionária nas decisões a tomar em todos os níveis e na prática das palavras de ordem do Partido.
1. Desenvolver o espírito da crítica entre os militantes e responsáveis. Dar a todos, em cada nível, a oportunidade de criticar, de dar a sua opinião sobre o trabalho e o comportamento ou a ação dos outros. Aceitar a crítica, donde quer que ela venha, como uma contribuição para melhorar o trabalho do Partido, como uma manifestação de interesse ativo pela vida interna da nossa organização.
Lembrar-se sempre que criticar não é dizer mal nem fazer intrigas. Criticar é e deve ser o ato de exprimir uma opinião franca, aberta, diante dos interessados, com base nos fatos e com espírito de justiça, para apreciar o pensamento e a ação dos outros, com o objetivo de melhorar esse pensamento e essa ação. Criticar é construir, ajudar a construir, fazer prova de interesse sincero pelo trabalho dos outros, pela melhoria desse trabalho.
Combater severamente a má língua, a mania das intrigas, o “diz-que-diz”, as críticas injustas e sem fundamento. Apreciar o pensamento e a ação de um camarada não é necessariamente dizer mal. Dizer bem, elogiar, encorajar, estimular – também é criticar. Sempre vigilantes contra as vaidades e orgulhos pessoais, devemos, no entanto, não poupar elogios a quem os merece. Elogiar com alegria, com franqueza, diante dos outros, todo aquele cujo pensamento e ação servem bem o progresso do Partido. Devemos igualmente aplicar uma crítica justa, denunciar francamente, censurar, condenar e exigir a condenação de todos aqueles que praticam atos contrários ao progresso e aos interesses do Partido; combater cara a cara os erros e faltas, ajudar os outros a melhorar o seu trabalho. Tirar lição de cada erro que cometemos ou que os outros cometem, para evitar cometer novos erros, para não cairmos nas asneiras em que os outros já caíram. Criticar um camarada não quer dizer pôr-se contra o camarada, fazer um sacrifício em que o camarada é a vítima: é mostrar-lhe que estamos todos interessados no seu trabalho, que somos um e um só corpo, que os erros dele prejudicam a nós todos, e que estamos vigilantes, como amigos e camaradas, para ajudá-lo a vencer as suas deficiências e a contribuir cada vez mais para que o Partido seja cada vez melhor.
Desenvolver o princípio da crítica em todas as reuniões do Partido, em todos os Comitês e no seio das forças armadas. Na guerrilha ou no exército, depois de cada operação contra o inimigo, devemos apreciar os resultados dessa ação e o comportamento de cada combatente. Tirar todas as lições dessa ação para fazer novas e melhores ações. No ensino, na produção, na atividade comercial, na assistência — em todos os ramos da nossa vida e da nossa luta — devemos ser capazes de criticar e de aceitar as críticas. Mas a crítica (prova de vontade dos outros de nos ajudar ou da nossa vontade de ajudar os outros) deve ser completada pela autocrítica (prova da nossa própria vontade de nos ajudarmos a nós mesmos a melhorar o nosso pensamento e a nossa ação).
Desenvolver em todos os militantes, responsáveis e combatentes, o espírito de autocrítica: a capacidade de cada um fazer uma análise concreta do seu próprio trabalho, de distinguir nele o que está bem do que está mal, de reconhecer os seus próprios erros e de descobrir as causas e as consequências desses erros. Fazer uma autocrítica não é apenas dizer “sim, reconheço a minha falta, o meu erro e peço perdão”, ficando logo pronto para cometer novas faltas, novos erros. Não é fingir-se arrependido do mal que fez, e ficar, no fundo, convencido de que os outros é que não o compreendem. Nem tão pouco fazer autocrítica é fazer uma cerimônia para depois poder ficar com a consciência tranquila e continuar a cometer erros. Autocriticar-se não é pagar um responso ou uma bula, nem é fazer penitência. A autocrítica é um ato de franqueza, de coragem, de camaradagem e de consciência das nossas responsabilidades, uma prova da nossa vontade de cumprir e de cumprir bem, uma manifestação da nossa determinação de ser cada dia melhor e dar uma melhor contribuição para o progresso do nosso Partido. Uma autocrítica sincera, não exige necessariamente uma absolvição: é um compromisso que fazemos com a nossa consciência para não cometermos mais erros; é aceitar as nossas responsabilidades diante dos outros e mobilizar todas as nossas capacidades para fazer mais e melhor. Autocriticar-se é reconstruir-se a si mesmo, para melhor servir.
2. Aplicar progressivamente em todos os níveis da direção do Partido o princípio da direção coletiva. Fazer tudo para que os órgãos dirigentes do Partido passem a funcionar realmente, não na base de uma, duas ou três pessoas, mas de todos os seus membros, homens e mulheres.
Direção coletiva quer dizer direção, mando ou comando feito por um grupo de pessoas e não uma só pessoa ou por algumas pessoas do grupo. Dirigir coletivamente, em grupo, é estudar os problemas em conjunto, para encontrar a sua melhor solução, é tomar decisões em conjunto, é aproveitar a experiência a inteligência de cada um, de todos para melhor dirigir, mandar, comandar. Na direção coletiva, cada pessoa do grupo dirigente deve ter funções próprias, bem definidas e é responsável pela execução das decisões tomadas pelo grupo em relação às suas funções. Dirigir coletivamente é dar a cada dirigente a oportunidade de pensar e de agir, exigir que tome as responsabilidades da sua competência, que tenha iniciativa, que manifeste com determinação e liberdade a sua capacidade criadora, que sirva bem o trabalho da equipa, que é o produto de esforços e das contribuições de todos. Dirigir coletivamente é coordenar o pensamento e a ação dos que formam o grupo, para tirar deles o melhor rendimento no cumprimento das tarefas do grupo, dentro dos limites da sua competência e no quadro das atividades e dos interesses da organização. Mas dirigir coletivamente não é nem pode ser, como alguns supõem, dar a todos e a cada um o direito de opinião e de iniciativas não controladas, criar a anarquia (falta de governo), a desordem, a contradição entre dirigentes, a discussão vazia, mania das reuniões sem resultados; nem tão pouco é dar largas à incompetência, à ignorância, ao atrevimento intelectual, só para se fingir que todos mandam. Se é verdade que duas cabeças valem mais do que uma, temos de saber distinguir as cabeças e cada cabeça deve saber exatamente o que tem de fazer. No quadro da direção coletiva, devemos respeitar a opinião dos camaradas que têm mais experiência, aprender com a experiência desses camaradas que, por seu lado, devem ajudar os outros, os menos experientes, a aprender e a melhorar o seu trabalho. No quadro da direção coletiva há sempre um ou outro camarada que tem mais categoria como responsável do Partido e que, por isso, tem mais responsabilidade individual, mesmo se a responsabilidade das tarefas do grupo couber a todos os membros do grupo. Temos de prestigiar esses camaradas, ajudá-los a terem cada dia mais categoria, mas não permitir que açambarquem (tomem conta) o trabalho e a responsabilidade do grupo. Devemos, por outro lado, lutar contra o espírito de comodismo, e desinteresse, o medo das responsabilidades, a tendência para concordar com tudo, para obedecer cegamente, sem pensar.
Combater o espírito de régulo, de chefe tradicional, patrão ou de capataz entre os responsáveis. Mas combater também o espírito de vassalo, de súdito ao serviço do chefe, de empregado zeloso, de criado ou de “boy”, entre os responsáveis e militantes. No quadro da direção coletiva, os órgãos superiores do Partido devem exigir aos que estão abaixo deles o cumprimento rigoroso do seu dever na base da colaboração consciente e construtiva. Os órgãos menos elevados devem exigir aos mais elevados que deem tarefas concretas a cumprir, palavras de ordem claras e tomem decisões sobre os problemas da sua competência.
Combater o espírito de grupo e de grupinhos, os círculos fechados, a mania do segredo entre algumas pessoas, as questões pessoais e a ambição do mando.
A direção coletiva deve reforçar a capacidade de direção do Partido e criar condições concretas para valorizar os membros do Partido.
3. Desenvolver, respeitar, e fazer respeitar, na prática das decisões e no cumprimento das palavras de ordem do Partido, a aplicação correta do centralismo democrático. Limitar concretamente as funções de cada órgão dirigente e dos organismos de base, estudar profundamente cada problema ou cada iniciativa nova, tomar decisões objetivas e dar palavras de ordem claras para cada tarefa e a realização prática dás palavras de ordem do Partido.
Centralismo democrático quer dizer que o poder de decisão, de dar palavras de ordem, de estabelecer tarefas – de dirigir – está concentrado em órgãos ou entidades centrais, com funções bem definidas, mas que essas decisões, palavras de ordem, etc., devem ser tomadas democraticamente, com base nos interesses e na opinião dos representantes das massas, com base no respeito pela opinião e pelos interesses da maioria. Quer dizer que cada decisão relativa a um problema novo deve ser tomada depois de uma ampla e livre discussão por parte dos órgãos nela interessados ou da base ao topo, se se trata de assunto que interessa a toda a vida do Partido. Depois dessa discussão e de acordo com os dados dela resultantes, os órgãos centrais tomam uma decisão, a qual deve passar imediatamente a ser cumprida em todos os níveis a que interesse, e sem mais discussões.
Centralismo, porque o poder, a capacidade de decidir e de dirigir está concentrado em órgãos especiais e nenhum outro órgão ou indivíduo pode usar desse poder. Democrático porque o uso do poder por esses órgãos não depende apenas da vontade dos que mandam, mas baseia-se nos interesses e na opinião expressa pela maioria. Para praticar cada vez melhor o centralismo democrático devemos estar atentos às aspirações e à opinião das massas populares no que respeita a cada problema importante da nossa vida e a nossa luta, devemos fazer funcionar todos os organismos de base do Partido e todos órgãos dirigentes, devemos desenvolver a crítica e a autocrítica e prestigiar cada dia os responsáveis e dirigentes que cumprem o seu dever. O centralismo democrático é uma escola de disciplina, de respeito pela opinião dos outros, de democracia e de capacidade de levar à prática as decisões tomadas.
4. Praticar, em todos os aspectos da vida do Partido, a democracia revolucionária. Cada responsável deve assumir com coragem as suas responsabilidades, deve exigir dos outros o respeito pela sua atividade e deve respeitar a atividade dos outros. Não esconder nada às massas populares, não mentir, combater a mentira, não disfarçar as dificuldades, os erros e insucessos, não acreditar em vitórias fáceis, nem nas aparências.
A democracia revolucionária exige que devemos combater o oportunismo, a tolerância diante dos erros, as desculpas sem fundamento, as amizades e a camaradagem com base em interesses contrários aos do Partido e do povo, a mania de que um ou outro responsável, é insubstituível no seu posto. Praticar e defender a verdade, sempre a verdade diante dos militantes, dos responsáveis, do povo, sejam quais forem as dificuldades que o conhecimento da verdade possa criar. A democracia revolucionária exige que o militante não tenha medo do responsável, que o responsável não tenha receio do militante nem medo das massas populares. Exige que o responsável viva no meio do povo, à frente do povo e atrás do povo, que trabalhe para o Partido ao serviço do povo.
No quadro da democracia revolucionária, o poder vem do povo, da maioria, e ninguém deve ter medo de perder o poder. O dirigente deve ser o intérprete fiel da vontade e das aspirações da maioria revolucionária, e, não, o dono do poder, o senhor absoluto que se serve do Partido e não serve o Partido. No quadro da democracia revolucionária, devemos evitar a demagogia, as promessas que não podemos cumprir, a exploração dos sentimentos do povo e das ambições dos oportunistas. Devemos agir de acordo com as realidades, dar a cada um a possibilidade de progredir, de verificar, pela sua ação e pela dos outros, que o Partido, é obra de nós todos e que todos pertencemos ao Partido que é o instrumento que o nosso povo criou para a conquista da sua liberdade e para a construção do seu progresso. No quadro da democracia revolucionária e nas condições concretas da nossa luta, devemos aumentar cada vez mais a força do povo, avançar com coragem para a conquista do poder pelo povo, para a transformação radical (na base) da vida do nosso povo, para uma etapa em que as armas e os meios de defesa da nossa revolução estarão inteiramente nas mãos do povo. Não ter medo do povo e levar o povo a participar em todas as decisões que lhe dizem respeito – esta é a condição fundamental da democracia revolucionária, que temos de realizar a pouco e pouco, de acordo com o desenvolvimento da nossa luta e da nossa vida.
A democracia revolucionária exige que estejam à frente do nosso Partido e do nosso povo os melhores filhos da nossa terra. Temos de eliminar, passo a passo os maus elementos do nosso Partido, os ambiciosos, os oportunistas, os demagogos (enganadores do povo), os desonestos, os que não cumprem o seu dever. Para abrir caminho cada vez mais àqueles que compreendem e vivem inteiramente a vida do nosso Partido, aos que desejam na realidade servir o Partido e o povo, aos que cumprem e querem cumprir cada vez mais e melhor os seus deveres de militantes, de responsáveis e de revolucionários. A aplicação correta dos princípios da crítica e autocrítica, da direção coletiva, do centralismo democrático e da democracia revolucionária, é o meio eficaz para obtermos uma das mais importantes, se não a mais importante vitória da nossa vida e da nossa luta, a saber:
Fazer com que o nosso Partido pertença cada dia mais àqueles que são capazes de torná-lo cada vez melhor.
Fazer do nosso Partido um instrumento eficaz para a construção da liberdade, da paz, do progresso e da felicidade do nosso povo, na Guiné e em Cabo Verde.
“Elogiar com alegria, com franqueza, diante dos outros, todo aquele cujo pensamento e ação servem bem o progresso do Devemos igualmente aplicar uma crítica justa, denunciar francamente, censurar, condenar e exigir a condenação de todos aqueles que praticam atos contrários ao progresso e aos interesses do Partido;”
Essa parte acima “o progresso do Devemos”, parece um erro de digitação, alguma palavra foi comida aí?
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Corrigido!
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