Luiz Carlos Prestes – Carta ao Comitê Central do PCB

Escrito por Antônio Almeida (pseudônimo de Luiz Carlos Prestes).

Documento sem título (reservado)​. Cópia. Abril, 1969.

Fonte: Arquivo Particular (cópia de documento original datilografado).

Disponível originalmente no portal A Coluna.

Transcrição realizada em novembro de 2020.

O TraduAgindo retirou as marcações de páginas e realizou as correções ortográficas apontadas na primeira transcrição e outras a fim de tornar o texto mais acessível, para ler o documento transcrito em sua versão original, clique aqui.

Apresentação

Trata-se de texto inédito de Luiz Carlos Prestes, elaborado em 1968 e apresentado para discussão em abril de 1969 ao Comitê Central do PCB, que se recusou a discuti-lo sob o pretexto que contrariava as resoluções do VI Congresso do partido, realizado em 1967.

Por essa razão o documento não pôde então ser divulgado. Prestes deixou uma cópia com sua irmã Lygia Prestes a qual, após o falecimento desta, ficou com a Anita Prestes. Outra cópia foi enviada para Moscou e mais tarde transferida para o Arquivo Edgard Leuenroth/Unicamp (coleção Luiz Carlos Prestes, pasta 009; fotocópia do documento original datilografado de 23 páginas).

Trata-se de documento extremamente crítico em relação à linha política e à tática do PCB no que se referia “aos problemas da frente única das forças antiditatoriais e do governo por que lutamos nas condições atuais”.

Neste documento encontram-se alguns elementos que iriam aparecer mais tarde em CARTA AOS COMUNISTAS (de março de 1980), texto em que Prestes crítica e faz autocrítica das deformações do PCB ocasionadas pela adoção de uma estratégia etapista da revolução.

Em entrevista à revista NOVOS TEMAS, n.7 (2012, p. 31-2), Anita Prestes esclarece: “Nesse documento… Prestes… apresenta vários problemas, mas levanta, basicamente, que os comunista no Brasil, naquela época, deviam lutar contra a ditadura, mas só lutar contra a ditadura descaracterizava o partido como um partido revolucionário da classe operária. Quer dizer, na luta contra a ditadura, na opinião dele, era necessário – ele cita Lênin, inclusive nesse sentido – aproveitar essa participação na luta contra a ditadura para educar o trabalhadores, as massas, no sentido da necessidade do socialismo, e formar quadros, as lideranças, para marchar rumo ao socialismo. Essa é a proposição dele nesse documento.”

Documento sem título de Luiz Carlos Prestes

1. Pelo Comitê Central foi decidido, em sua reunião de setembro de 1968, colocar na ordem-do-dia para discussão, a linha política e tática do Partido no que se refere aos problemas da frente única das forças antiditatoriais e do governo por que lutamos nas condições atuais​. É evidente que, ao tomar essa resolução, não tinha em mira o CC modificar ou rever a linha traçada pelo VI Congresso, como está exposta em sua Resolução Política, mas decidir a respeito da interpretação que deve ser dada a uma ou outra passagem daquela Resolução​ Política, em torno das quais surgiram divergências de interpretação.

Justamente por isso, foi também decidido, que os membros do CC poderiam apresentar por escrito sua opinião sobre os problemas em discussão, para prévio conhecimento dos demais membros do CC, e que se partiria das opiniões escritas que fossem apresentadas para realizar-se a discussão da próxima reunião ordinária do CC, como ponto obrigatório da ordem-do-dia.

2. Cabe aqui recordar que a questão em apreço foi suscitada no CC em consequência da maneira por que abordei problemas relacionados com a linha política e tática do Partido em dois artigos por mim assinados: um deles na VOZ OPERÁRIA (julho de 1968) e outro na REVISTA INTERNACIONAL (“O MUNDO EM REVISTA”, nº 5/6, de 1968). Algumas passagens desses artigos foram consideradas errôneas ou, pelo menos, contrárias ao espírito e à letra da resolução Política do VI Congresso. Tanto que para ser publicado o meu segundo artigo na versão brasileira da REVISTA INTERNACIONAL, decidiu o CC que, a título de “Nota do autor”, seria agregado ao referido artigo, como de fato se deu, todo um parágrafo da Resolução Política do VI Congresso. E com isto concordei porque não vejo nenhuma contradição entre o que escrevo nos meus referidos artigos e a Resolução Política do VI Congresso, como procurarei em seguida demonstrar.

3. São os seguintes os trechos de meus artigos postos em dúvida:

Do artigo – “Carlos Marx e o Marxismo”, publicado em VOZ OPERÁRIA, de julho de 1968:

“Esta lição de Lênin ajuda-nos também na luta contra as tendências de direita que se manifestam na aplicação da tática do Partido de parte principalmente daqueles que confundem o regime político imposto ao país pelos golpistas de 1964, já consagrado pela Constituição fascistizante de 1967 com o regime anterior da Constituição de 1946, particularmente durante o governo do Sr. João Goulart. Antes do golpe militar de 1964, a tática de nosso Partido consistia em, através da pressão de massas, exigir do governo reforma que determinassem mudanças na correlação de forças políticas no sentido de conquista de um governo nacionalista e democrático. Agora, lutamos contra a ditadura militar reacionária e entreguista, pelo seu isolamento e derrota, pela sua substituição por um governo revolucionário, ou, pelo menos, efetivamente democrático, por um outro regime político”.

No artigo publicado na REVISTA INTERNACIONAL, nº6, de junho de 1968 ou na versão brasileira, em MUNDO EM REVISTA, nº 5/6, de 1968, sob o título: “A linha política e tática dos comunistas brasileiros nas novas condições”:

“d) O Partido Comunista luta, na etapa atual, pela conquista de um governo revolucionário, democrático e antiimperialista, capaz de abrir ao proletariado o caminho para o socialismo. A luta contra a ditadura pode resultar não somente na liquidação do regime político semifascista atual, mas ir adiante e resultar na liquidação do próprio regime de capitalistas e latifundiários ligados ao imperialismo.

“Esta não é uma hipótese abstrata, existem as premissas objetivas para que tal processo possa ocorrer. A crise em que o Brasil se debate não pode ser resolvida sem a realização de reformas profundas em sua estrutura, isto é, não pode ser resolvida a não ser pela revolução. A luta contra a ditadura pode adquirir um rumo tal que a derrocada desta leve consigo o próprio regime social existente. Para que tal hipótese possa acontecer, entretanto, é necessário que as forças que estão interessadas numa solução revolucionária – a classe operária, a pequena burguesia urbana e os camponeses – representem tal força dentro da frente antiditatorial e desempenhem tal papel na luta contra a ditadura que, ao derrubarem esta, estejam em condições de fazer prosseguir o processo de aprofundá-lo até que ele adquira um caráter revolucionário. O Partido Comunista deseja e trabalha para que assim aconteça.

“Mas a ditadura pode ser derrotada e liquidada sem que as forças revolucionárias da frente antiditatorial disponham de poder suficiente para fazer prosseguir o processo e instaurar, no lugar da ditadura, um poder revolucionário. Neste caso, o governo que daí surgir pode ser mais ou menos democrático, mais ou menos avançado, segundo a correlação concreta de forças que existir no momento​ de sua constituição. Neste caso, os comunistas poderão participar ou não deste governo, poderão apoia-lo ou não, dependendo do caráter concreto que ele tiver. Participando ou não de um governo antiditatorial que se instalar no país, apoiando-o ou não, os comunistas continuarão a lutar por seus objetivos revolucionários”.

4. A divergência surgiu a respeito da maneira por que abordei, nos dois artigos, o problema do governo por que lutam os comunistas nas condições atuais. A alguns camaradas pareceu haver contradição entre a posição por mim exposta e aquela que está expressa na Resolução Política do VI Congresso, no seguinte parágrafo:

“Vários fatores podem determinar a derrota do regime ditatorial e a formação de um novo governo.

Os comunistas que orientam sua ação no sentido da conquista de um governo revolucionário, participarão, no entanto, junto com as demais forças que se opõem ao atual regime, da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais. A participação das forças fundamentais da frente antiditatorial nesse governo assegurará condições para a efetiva democratização do regime e o pleno desenvolvimento da luta das massas pela emancipação [[emancipação]] nacional e o progresso do país. A atitude dos comunistas, diante de qualquer outro governo intermediário dependerá da conjuntura concreta, das posições assumidas pelo imperialismo e as forças reacionárias internas, do comportamento da frente única e, fundamentalmente, das possibilidades que se abram para a livre mobilização da classe operária e seus aliados. Participando ou não de tais governos, os comunistas prosseguirão na luta por seus objetivos programáticos”. (pg. 66/67).

5. A questão central consiste, portanto, em interpretar esse parágrafo da Resolução Política do VI Congresso que, como é sabido de todos os que participaram do Congresso, resultou de prolongado debate no plenário do Congresso e na respectiva Comissão de resoluções. A questão já fora, aliás, discutida na Comissão que elaborou as ​Teses para a discussão do VI Congresso e no debate público que precedeu o VI Congresso.

No referido parágrafo há duas afirmações principais: a primeira diz, ​no presente​, que os comunistas “orientam sua ação no sentido da conquista de um governo revolucionário”; e a segunda diz, ​no futuro​, quer dizer, no momento oportuno, quando for possível ou necessário, que ​participarão​ “da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais”.

Ora, o problema da constituição de um governo é um problema concreto, depende fundamentalmente da correlação de forças sociais e políticas em determinado momento dado. Os comunistas lutam por um programa revolucionário que só poderá ser realizado, na atual etapa da revolução brasileira, por um governo revolucionário das forças antiimperialistas e antifeudais. Declaram, porém, que nas condições atuais, quando concentram esforços na luta pelas liberdades democráticas, pela derrota da ditadura, estão dispostos, “junto com as demais forças que se opõem ao atual regime”, a participar “da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais”. Esta é, portanto, uma possibilidade que se tornará realidade em determinada situação concreta, quando, diante de uma crise de governo (já efetiva ou em perspectiva imediata), coloquem-se, de fato, para a frente única das forças antiditatoriais, a possibilidade de constituir um governo para substituir a ditadura. Trata-se, portanto, da hipótese da queda da ditadura em situação ainda não revolucionária, em que, não sendo possível a imediata constituição de um governo revolucionário, os comunistas participarão da luta pela constituição de um governo intermediário, de aproximação.

Assim sendo, é necessário compreender que a luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais não é, de forma alguma, uma ​etapa obrigatória do processo revolucionário, mas apenas uma possibilidade. Em resumo: os comunistas têm como bandeira a luta pela conquista de um governo revolucionário das forças antiimperialistas e antifeudais – este o objetivo imediato de nosso Partido na etapa atual da revolução. Para alcançar esse objetivo, nas condições atuais, lutamos pela unidade de todas as forças antiditatoriais. Nessa luta pela derrota da ditadura é ​possível​, ante de que cheguemos no país a uma situação revolucionária, que se dê uma crise de governo, que torne viável a constituição de um governo das forças que se opõem a ditadura. Quando isso se der, os comunistas participarão da luta pela constituição de um tal governo. Mas, enquanto não se configura tal possibilidade, nosso Partido luta por que a queda da ditadura leva a sua substituição por um governo revolucionário, o qual será, evidentemente, um governo democrático, ​ou ​efetivamente democrático (ditadura democrática), em que predominarão as forças fundamentais da revolução. Estas forças, na medida em que estiverem ganhas para os objetivos da atual etapa da revolução brasileira e que desenvolvam em todos os terrenos uma ampla e perseverante luta de classes, iniciarão as medidas contra a dominação imperialista, contra o latifúndio e a burguesia entreguista, quer dizer, pela completa emancipação nacional e o progresso do país, abrindo, assim, o caminho para a vitória do socialismo em nosso país. E é porque tem em mira esse objetivo que nosso Partido concentra seus esforços – como diz expressamente a Resolução Política do VI Congresso (pg. 75) – “no sentido de impulsionar o movimento operário, camponês e popular e ganhá-lo para as posições revolucionárias, levar adiante a grande tarefa de unir todas as forças democráticas para derrotar o regime ditatorial e abrir caminho a um desenvolvimento independente e progressista​ da nação”.

6. Estará, no entanto, a interpretação que damos àquele parágrafo da Resolução Política do VI Congresso, coerente com o espírito vencedor no Congresso e exposto em sua Resolução Política, tomada, não parcialmente, mas em seu todo? É o que passamos a examinar, concentrando, porém, nossa análise nos capítulos IV e V da referida Resolução Política, que tratam respectivamente de “Nosso objetivo estratégico” e de “Nossa tática”.

No capítulo IV são apresentadas as linhas básicas do programa do Partido. Nosso Partido, como se afirma em seu Estatuto, “tem por objetivo a conquista do poder político para o estabelecimento do socialismo e do comunismo em nossa Pátria. Na etapa atual, os objetivos do Partido consistem em unir as mais amplas forças antiimperialistas e democráticas para libertar o Brasil da dominação imperialista e da exploração latifundiária e conquistar o regime nacional democrático”.

Quer dizer, nosso Partido é um Partido político da classe operária que luta pelo ​socialismo e a construção do comunismo e nosso país, isto é, tem por objetivo acabar com a exploração do homem pelo homem. Foi desse ponto de vista de classe que o VI Congresso examinou a situação concreta em nosso país, afirmando em sua Resolução Política que o “Brasil vive uma crise de estrutura” e assinalando as classes revolucionárias e aquelas que defendem a conservação da atual estrutura econômico-social. Formulada a contradição fundamental na sociedade brasileira, define a Resolução Política o caráter da revolução em sua etapa atual como nacional e democrática. E após apresentar, de maneira sintética, os objetivos da revolução nessa etapa, quer dizer, de esboçar o programa do Partido na atual etapa da revolução, afirma:

“A realização dessas transformações na estrutura da economia exige uma profunda mudança na correlação de forças políticas e a passagem do poder estatal para as mãos das classes e camadas que participam da luta contra o imperialismo e latifúndio”. (pg. 45).

No centro, portanto, de toda a atividade de nosso Partido está a luta pelo poder estatal da frente única das​ forças antiimperialistas e antifeudais, por um governo dessas forças, o “governo revolucionário”​ por cuja conquista orientam os comunistas sua ação, conforme diz a Resolução Política do VI Congresso naquele parágrafo da página 66, cuja interpretação está em discussão.

A conquista desse poder estatal e desse governo revolucionário é a meta de nosso Partido na atual etapa da revolução, só esse poder poderá dar início às medidas contra a dominação imperialista e a exploração latifundiária, indispensáveis ao progresso do país, à sua completa emancipação nacional, passo necessário à conquista do socialismo. É para essas “posições revolucionárias” que precisamos ganhar a classe operária e o movimento camponês e popular, quer dizer, as forças fundamentais da revolução. Mas as massas só aprendem com a própria experiência, através da luta diária contra seus exploradores e opressores. Cabe por isso ao Partido Comunista, na luta por seus objetivos programáticos, (ou estratégicos) saber inserir-se no processo real, participar ativamente do movimento operário, do movimento camponês, das diversas correntes do movimento nacional e democrático, procurando, como instituição política independente da classe operária, constituir-se como o elemento unificador desses movimentos no sentido da luta comum​ pelas liberdades democráticas, pelo isolamento e derrota da ditadura e do atual regime político.

7. Passamos, assim, ao terreno da tática do Partido, das formas de luta e de organização, das formas que devemos, nas condições atuais, fazer uso para nos aproximarmos de nossos objetivos programáticos, tática que, em seus elementos, básicos, foi elaborada pelo VI Congresso e é exposta no capítulo V da Resolução​ Política do Congresso.

Vejamos quais são os elementos básicos dessa tática:

1º) Nas condições atuais de nosso país, a principal tarefa tática dos comunistas consiste em unificar todas as forças sociais e políticas que possam ser mobilizadas para a luta pelas liberdades democráticas e pela derrota da ditadura imposta ao país pelos golpistas de 1964. Essa frente única das forças que se opõem a ditadura pode e deve ser muito mais ampla que a frente única nacionalista e democrática anterior ao golpe de 1º de abril de 1964 e ampliou-se mais ainda após o golpe militar de 13 de dezembro de 1968​ [Referência ao AI-5 – N.E.]​, como já afirmou o Comitê Central em sua resolução de fevereiro último. Será uma frente única que incluirá desde a classe operária, os camponeses e as camadas médias urbanas até a burguesia nacional e outros setores das classes dominantes objetivamente prejudicadas pela ditadura.

2º) Essa frente única antiditatorial (ou democrática) só pode ganhar consistência e firmeza na medida em que se apoiar na classe operária, nos camponeses e na pequena burguesia urbana, quer dizer, nas forças fundamentais da revolução. Só tendo por base a unidade dessas forças será possível atrair para a frente única as demais forças antiditatoriais e fazer avançar as ações contra a ditadura de maneira consequente e firme.

3º) Nestas condições, outro elemento da tática está na necessidade de desenvolver, por iniciativa principalmente dos comunistas, a organização e unidade da classe operária, condição básica para fazer avançar na aliança com as massas camponesas e as camadas médias urbanas. Diz-se, por isso, na Resolução Política do VI Congresso: “A atividade primordial dos comunistas deve dirigir-se no sentido de organizar e desenvolver a unidade de ação da classe operária em defesa de seus interesses econômicos e políticos imediatos e pela derrota da ditadura”.

4º) Outro elemento básico da tática do Partido, explicitamente colocado na Resolução Política do VI Congresso, embora seja uma questão de princípio para todo o proletariado revolucionário marxista-leninista, está no caráter de massas da luta pela derrota da ditadura: “O processo de isolamento e derrota da ditadura – diz a Resolução Política do VI Congresso – é o do desenvolvimento da luta de massas e de unidade de ação das forças democráticas”. (pg. 64).

5º) Por isso, ao mesmo tempo que devem impulsionar o movimento de massas, cabe aos comunistas fazer esforços por unificar “a ação de todas as forças e personalidades políticas que resistam ao regime e a ele se opõem”, como diz a Resolução Política do VI Congresso. (pg. 55). Isto significa que a frente única antiditatorial compõe-se de forças sociais e políticas que têm objetivos finais diferentes e que são também diferentemente consequentes na luta contra a ditadura. Unem-se para a luta contra a ditadura e o atual regime e aceitam para tanto uma plataforma comum que deverá ser elaborada, já que os comunistas não impõem de forma alguma seus pontos de vista e lutam pela efetiva unidade de todos, sem qualquer discriminação, que queiram participar da luta contra a ditadura. Participando da frente única, não renunciam, porém, os comunistas a luta por seus objetivos revolucionários nem ao direito de crítica às posições errôneas de seus aliados. A crítica dos aliados constitui um dos princípios fundamentais da política de alianças do marxismo-leninismo.

Quanto à plataforma unitária, cujos pontos básicos são apresentados, a título de sugestão e para base da discussão na Resolução Política do VI Congresso (pg. 56/57), torna-se​ necessário esclarecer que não é apresentada como plataforma de um futuro governo, mas, como se diz expressamente na Resolução Política do VI Congresso, para que sirva de “fator decisivo para a formação e avanço da frente antiditatorial” (pg. 56). Mesmo porque um programa de governo só poderá ser formulado diante de uma situação concreta, conhecida a correlação de forças sociais e políticas existente no momento de sua constituição.

8. Nestas condições, é evidentemente pacífico que os comunistas ao lutarem pela plataforma comum da frente antiditatorial, não ocultam seu programa revolucionário, apresentam-se sempre como instituição política da classe operária, independente, fazendo esforços para ganhar para suas posições revolucionárias, para seu programa, as forças fundamentais da revolução. Quer dizer, os comunistas, ao lutar contra a ditadura, apontam às massas a necessidade de conquistarem elas um governo revolucionário, um regime político efetivamente democrático, como único capaz de [​p. 11​] realizar as medidas indispensáveis ao progresso do país. Dir-nos-ão: mas esta insistência na indicação dos objetivos revolucionários do Partido Comunista (objetivos programáticos ou estratégicos, se quiserem) não enfraquecerá a unidade de todos os que lutam, no momento atual, pelas liberdades democráticas, contra a ditadura? Respondendo a uma pergunta idêntica, dizia Lênin que, ao contrário, fortalecerá a todos os que lutam pela liberdade política, e agregava: “Só são fortes os lutadores que se apoiam em interesses reais ​claramente compreendidos de determinadas classes​, e todo fator que oculta estes interesses de classe, que desempenham já um papel dominante na sociedade atual, não pode senão enfraquecer os lutadores.” (Obras completas, ed. Cartago, tomo II, pg. 317).

9. Além desses elementos básicos que definem a tática dos comunistas nas condições atuais, a Resolução Política do VI Congresso, no fim do capítulo V (Nossa tática) apresenta algumas hipóteses a respeito do desfecho a que pode levar a luta contra a ditadura, por sua derrota e substituição.

É apresentada, em primeiro lugar, a hipótese de “crises de governo e novos golpes” (pg. 65), afirmando-se então que nessa emergência “só a intervenção das forças populares, levantando suas próprias bandeiras de luta poderá impedir uma solução reacionária, com a simples substituição de golpistas no poder, e impor uma solução democrática”.

A segunda hipótese refere-se à possibilidade de que setores das classes dominantes busquem uma solução com exclusão das forças populares. “Nesse caso – diz a Resolução Política do VI Congresso – as massas devem tomar a iniciativa e, sem esperar pelos atos do governo, reconquistar, na prática, as liberdades democráticas e exigir medidas concretas que assegurem o desenvolvimento democrático da situação”. (pg. 65/66).

Finalmente, é apresentada a hipótese de poder a ditadura ser substituída por um governo da frente única das forças antiditatoriais. [​p. 12​] Nesse caso, após reafirmar que “os comunistas orientam sua ação no sentido da conquista de um governo revolucionário”, é feita a afirmação de que “participarão, no entanto, junto com as demais forças que se opõem ao atual regime, da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais”. É de supor – e isto está explicitamente colocado – que de tal governo participem, portanto, as forças fundamentais da frente antiditatorial, o que permitirá prever que seja assegurada a “efetiva democratização do regime e o pleno desenvolvimento da luta de massas pela emancipação nacional e o progresso do país”. (pg. 66).

É claro, no entanto, que esse desenvolvimento só se dará se no processo de luta contra a ditadura, o Partido Comunista tiver realizado um esforço permanente no sentido de ganhar a classe operária e demais forças fundamentais da revolução para suas posições programáticas, para a luta, portanto, pelo governo revolucionário, tiver conseguido dar, assim, a frente única antiditatorial um conteúdo de frente antiimperialista e antifeudal. Supor o contrário, seria cair no espontaneísmo e, como é sabido, na luta de classes o espontaneísmo só pode abrir caminho para a ideologia burguesa no movimento operário.

Agrega-se, ainda, no mesmo parágrafo da Resolução Política do VI Congresso que “diante de qualquer outro governo intermediário”, a atitude dos comunistas dependerá da conjuntura concreta. E encerra-se o parágrafo com a afirmação categórica de que “participando ou não de tais governos, os comunistas prosseguirão na luta por seus objetivos programáticos”, quer dizer, continuarão, como instituição política independente, a luta por seus objetivos revolucionários.

O problema da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais está, assim, colocado como uma hipótese possível, de maneira geral, como uma declaração de que os comunistas, quando se tornar viável concretizar- a forma de governo por que se deve lutar, dentro da correlação de forças sociais e políticas existente, ​participarão​, junto com as demais forças antiditatoriais dessa luta.

E é justamente porque o problema do governo só pode ser levantado de acordo com a situação concreta que, em geral, nos documentos programáticos e de orientação tática de diversos partidos marxistas-leninistas não é expressamente levantado esse problema senão como indicação geral, não são formuladas as hipóteses possíveis. Entre outros exemplos, merece referência aqui o que disse o camarada Gus Hall, secretário geral do Partido Comunista dos Estados Unidos, ao apresentar o novo programa do Partido. Refere-se ele à possibilidade de um governo “antimonopolista”, um governo intermediário ainda não anticapitalista ou socialista, quer dizer, ainda dentro dos quadros do regime capitalista:

“Alguns camaradas perguntaram também como expõe nosso Programa a possibilidade de um governo antimonopolista.

“Opino que este problema figura entre os que não estamos hoje em condições de abordar, dando uma resposta concreta. Por isso, o projeto de Programa fala dele em linhas gerais, assinalando apenas a possibilidade de semelhante perspectiva. Creio que, devemos deixar assim esta questão. Uma definição concreta do conceito de governo antimonopolista dá a impressão de que – é necessária mais uma etapa. É possível que a luta antimonopolista não conduza a formação de semelhante governo”. (Informe ao Congresso Extraordinário do P.C. dos EE.UU.​ 17​, dif. Boletin de Informaciones, Praga, nº 15, de 1968, pg. 29).

11. O problema do governo é um problema concreto que, ao ser posto na ordem-do-dia, só pode ser levantado como diretiva para a ação imediata. Ora, isto só se dá, ou quando a situação já seja revolucionária ou na oportunidade de uma crise de governo. No primeiro caso, cabe ao Partido Comunista apresentar de maneira concreta, de acordo com a situação, o tipo de governo revolucionário pelo qual se deve lutar. (Os bolcheviques, em 1905, lutaram por um ​governo provisório revolucionário​, e em 1917, por ​todo o poder aos sovietes​). No segundo caso, não sendo ainda a situação revolucionária, mas diante de uma crise de governo, provocada pelo crescimento do movimento de massas ou pelo aprofundamento das contradições no seio da própria ditadura, cabe ao Partido Comunista, juntamente com as demais forças constituintes da frente antiditatorial concretizar, de acordo com a correlação de forças existente, o ​tipo de governo das forças antiditatoriais por que se deve lutar – fruto de um compromisso, portanto. Quer dizer: o governo das forças antiditatoriais é apenas uma ​possibilidade que pode surgir no processo de luta contra o regime ditatorial. Os comunistas participam da frente única antiditatorial, lutam pelo programa mínimo que for adotado por essa frente, mas não arquivam seu programa, continuam lutando por um governo revolucionário – único capaz de realizar as transformações profundas exigidas pela situação do país. Nesse processo, podem surgir condições políticas que exijam colocar na ordem-do-dia​ o problema da constituição de um governo das forças antiditatoriais. Quais são essas condições? Dimitrov, em seu informe ao VII Congresso da Internacional Comunista, referindo-se à possibilidade de um governo da frente antifascista, assim responde à pergunta:

“Sob que condições objetivas será possível a formação de um tal governo? A esta pergunta se pode contestar de um modo muito geral: sob as condições de uma ​crise política​, em que as classes dominantes já não estão em condições de pôr fim ao potente ascenso do movimento antifascista de massas. Mas isto é apenas uma perspectiva geral, sem a qual só será possível, na prática, a formação de um governo da frente única. Somente em presença de determinadas ​premissas especiais​, pode ser colocado na ordem-do-dia o problema da formação deste governo como tarefa politicamente necessária”, Sofia, 1964, pg. 185).

E, a seguir, expõe as três “premissas especiais” que, segundo pensa, merecem a maior atenção:

Primeiro​. Quando o aparelho estatal da burguesia já esteja bastante ​desorganizado e paralisado para que a burguesia não possa impedir a formação de um governo de luta contra a reação e o fascismo.

Segundo. Quando as mais amplas massas dos trabalhadores e em particular os sindicatos de massas levantem-se impetuosamente ​contra o fascismo e a reação, mas ​não estejam ainda preparados para lançarem-se à insurreição, ​a fim de lutar, sob a direção do Partido Comunista pela conquista do Poder soviético.

Terceiro. Quando o processo da diferenciação e radicalização nas fileiras da social democracia e dos demais partidos que participam da frente única haja levado a que uma parte considerável dentro delas ​exija medidas implacáveis contra os fascistas e demais reacionários​, lute junto com os comunistas contra o fascismo e manifeste-se abertamente contra o setor reacionário e hostil ao comunismo de seu próprio partido. (Ob. cit., pg. 183/184).

São premissas que devem refletir, aplicadas ao nosso caso, o isolamento e o recuo ou retirada da ditadura, a ofensiva das forças antiditatoriais. Isto não existe em nosso país, onde estamos ainda na fase de acumulação de forças, de resistência e oposição à ditadura. Tanto que, como dizia o Comitê Central no Informe de balanço ao VI Congresso: “no quadro atual, quando o movimento de massas ainda não se recuperou do golpe sofrido e é bastante reduzida a resistência à ditadura, chega as raias da profecia afirmar-se qual será a forma de luta principal no desfecho vitorioso da luta contra o regime militar reacionário”. (pg. 31).

Quer dizer, estamos ainda em processo de elaboração do caminho da revolução brasileira, sendo prematuro prever ​agora qual será o tipo de governo que substituirá a ditadura. Apresentamos algumas hipóteses apenas na Resolução Política do VI Congresso.

12. Os comunistas prevêm a possibilidade, no processo de luta contra a ditadura, da constituição de um governo das forças antiditatoriais e declaram que, diante de semelhante possibilidade, participarão da luta pela constituição desse governo. Mas colocar na ordem-do-dia, como tarefa imediata, a luta pelo governo das forças antiditatoriais, quando ainda não se dão aquelas ​premissas especiais (ou algo semelhante, de acordo com a atual situação mundial e em nosso país) a que se refere Dimitrov, significa pôr de lado o objetivo revolucionário do Partido Comunista, por cuja conquista os comunistas “orientam sua ação”, significa deixar de fazer esforços para ganhar a classe operária e demais forças fundamentais da revolução para as posições da vanguarda. Não podem os comunistas ir às massas, chamando-as, ao mesmo tempo, para lutarem por dois governos diferentes. Na verdade, lutamos por um governo revolucionário, mas em determinado momento, dadas as circunstâncias, podemos concretizar essa orientação geral e chamar as massas para a luta por um determinado governo, seja um governo revolucionário, ou seja apenas um governo (intermediário) das forças antiditatoriais. Os bolcheviques, durante anos, seguidos, lutavam pela República, (República, oito horas de trabalho e terra para os camponeses), e somente quando a situação já era revolucionária, em 1905, concretizaram essa orientação geral, chamado as massas à luta pelo governo provisório revolucionário, e, mais tarde, em 1917, depois de fevereiro, por todo o poder aos sovietes.

Colocar ​agora​, nas condições em que nos encontramos, como bandeira de nosso Partido, a luta por um ​governo das forças antiditatoriais​, é, no fundo, uma posição que reflete uma certa tendência golpista; e, ao mesmo tempo, pretender fazer no processo da revolução brasileira uma nova etapa obrigatória, “uma fase democrática”, na expressão usada por Dimitrov.

Reflete uma certa tendência golpista, porque traduz a esperança ou uma certa pressa pequeno-burguesa de que a oposição burguesa à ditadura seja capaz de derrotá-la, já que, como sabemos, o movimento de massas ainda não tem condições para fazê-lo. Levantar agora, como reivindicação imediata, a conquista de um governo das forças antiditatoriais é o mesmo que supor possível por abaixo a ditadura, quando não há ainda a maioria, ou, pelo menos, parcela considerável do povo organizado ao lado do proletariado revolucionário. Reflete esperança no êxito da ação conspirativa de pequenos grupos.

Quanto a se pretender criar uma nova etapa obrigatória, democrática no processo de luta e do salto revolucionário da ditadura latifundiário-burguesa à ditadura do bloco de classes revolucionárias, significa de fato postergar a luta pelos objetivos revolucionários, reflete uma tendência oportunista de direita.

13. Argumenta-se, ainda, que o governo das forças antiditatoriais deve ser visto como uma forma de transição ou de aproximação, segundo as expressões utilizadas por Lênin. Certamente, isto se pode dar, é mesmo bastante provável que no processo da revolução brasileira um ou mais governos de transição precedam ao governo efetivamente revolucionário das forças antiimperialistas e antifeudais. Quer dizer, o governo das forças antiditatoriais pode ser ​uma das formas transitórias mais importantes. Mas só as condições concretas do momento, quando se tornar oportuno colocar na ordem-do-dia o problema do governo, nos permitirão fazer tal afirmação. Invocar o nome de Lênin para defender o gradualismo de uma nova etapa ​obrigatória no processo revolucionário é tergiversar​ o pensamento leninista, esquecer que Lênin fala de ​transição ou ​aproximação para a revolução e não para uma etapa democrática intermediária. A este respeito, são esclarecedoras as seguintes palavras de Dimitrov no mesmo Informe ao VII Congresso da Internacional Comunista:

“Faz quinze anos Lênin nos convidava a que concentrássemos toda a atenção em buscar as formas de ​transição ou de aproximação à revolução proletária. Pode ocorrer que o ​governo da frente única seja, numa série de países, uma das formas transitórias mais importantes. Os doutrinários “de esquerda” sempre passaram por alto esta indicação de Lênin, falando somente da “meta”, como propagandistas limitados, sem preocupar-se jamais com as “formas de transição”. E os oportunistas de direita tentavam estabelecer uma “fase democrática intermediaria”, especial, entre a ditadura da burguesia e a ditadura do proletariado, para sugerir à classe​ operária a ilusão de um passeio parlamentar pacífico de uma ditadura a outra. Esta “fase intermédia” fictícia a chamavam também de “forma de transição” e invocavam inclusive o nome de Lênin. Mas não foi difícil descobrir a fraude, pois Lênin falava de uma forma de transição e de aproximação à “revolução proletária”, isto é, ao derrocamento da ditadura burguesa e ​não de uma forma transitória qualquer ​entre a ditadura burguesa e a proletária”. (Ob. Cit. pg. 187).

14. Argumenta-se também que não se pode separar a tática da estratégia e que sendo a tática revolucionária é desnecessário insistir na propaganda dos objetivos revolucionários ou programáticos do Partido. Os que assim argumentam apoiam-se na letra da Resolução Política do VI Congresso, onde, ao formularmos qual a tarefa tática na situação atual, dizemos: “A realização dessa tarefa está estreitamente ligada aos objetivos revolucionários em sua etapa atual e ao desenvolvimento da luta de classes operária pelo socialismo”. (pg. 47).

Na interpretação desse trecho não se pode, porém, ser unilateral, porque nele se diz, de um lado, que a tática é revolucionária, a luta por ela aproxima dos objetivos estratégicos, mas diz também, de outro lado, que ao lutarmos pelas tarefas táticas não deixamos de lutar por ganhar a classe operária e demais forças revolucionárias para os objetivos revolucionários (programáticos ou estratégicos) de vanguarda, que uma coisa está estreitamente ligada a outra. É o ensinamento de Lênin, que no verão de 1913, ao redigir a resolução do Comitê Central do P. O.S.D.R. [Partido Operário Social-Democrata Russo – N.E.] escreveu: O POSDR vem reivindicando faz muito, em seu programa mínimo, a liberdade de associação, de palavra, de imprensa, etc., vinculando estreitamente todas estas reivindicações com a luta revolucionária pela derrocada da monarquia tzarista”. (Obras Completas – Ed. Cartago – tomo XIX – pg. 415)

Quer dizer, a luta pela democracia que, nas circunstâncias atuais é o elo principal das lutas de massas, o fator principal de mobilização das forças majoritárias da nação contra os seus inimigos, essa luta pela democracia, para se tornar vitoriosa, terá que se transformar em luta contra o imperialismo e o latifúndio. E é justamente por isso que, ao referir-se à atividade do Partido, afirma-se na Resolução Política do VI Congresso:

“Para prosseguir em seu avanço e cumprir sua missão de vanguarda revolucionária do proletariado e de todo o povo brasileiro, nosso Partido deve concentrar seus esforços no sentido de impulsionar o movimento operário​, camponês e popular e ganhá-lo para as posições revolucionárias, levar adiante a grande tarefa de unir todas as forças democráticas para derrotar o regime ditatorial e abrir caminho a um desenvolvimento independente e progressista da nação…” (pg. 75).

15. Sou de opinião que o problema em debate é de grande importância, para nosso Partido no momento que atravessamos. Em 1931, Manuilsk​​, então Secretário geral do Comitê Executivo da Internacional Comunista, já sintetizava sua opinião sobre os PP.CC.​ [Partidos Comunistas – N.E.] da América Latina nos seguintes termos: “Nos países da América Latina temos uma tarefa bem modesta: terminar com os ​putschs e abordar a luta de classes e contra o imperialismo estrangeiro”. Opinião esta que coincide, no essencial, com a posição autocrítica que assumimos no VI Congresso de nosso Partido, ao dizermos no Informe de balanço apresentado pelo Comitê Central​: “No fundamental, os erros que cometemos na aplicação da linha do V Congresso decorreram de uma posição subjetivista, de pressa pequeno-burguesa e do golpismo, que nos levaram a crer na vitória fácil e imediata, a contribuir, com nossa atividade política, para precipitar​os acontecimentos, sem que existissem condições que pudessem assegurar a vitória da classe operária e das forças nacionalistas e democráticas”. (pg. 17)

Na luta pela constituição da frente antiditatorial os comunistas dirigem-se a “todas as forças e personalidades políticas que resistem ao regime e a ele se opõem” (Resolução Política do VI Congresso, pg. 55), declaram-lhes, como fez o Comitê Central em fevereiro último, que participarão “da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais etc.”. Quer dizer, não subestima o trabalho por cima, mas se bem que o decisivo é o trabalho unitário por baixo, junto às grandes massas trabalhadoras, mobilizando-as e organizando-as para a luta por seus interesses imediatos, econômicos e políticos, e ganhando-as, através da própria experiência, mas também da agitação e da propaganda, para as posições revolucionárias da vanguarda. “Os comunistas – escreveram Marx e Engels no “manifesto Comunista” – combatem pelos interesses e objetivos imediatos da classe operária, mas, ao mesmo tempo, defendem e representam, no movimento atual, o futuro do movimento”. (Marx e Engels – Obras Escolhidas – Ed. Vitória – tomo I – pg. 46).

Nas condições atuais, em nosso país, o essencial é desenvolver a consciência da classe operária e demais forças trabalhadoras, ganhá-las para as posições revolucionárias da vanguarda, tornar conhecidas as alternativas que nosso Partido apresenta como soluções para assegurar a completa emancipação nacional e o progresso do país. É a grande lição de Lênin:

“A tática do proletariado deve ter em conta, em dado grau de seu desenvolvimento, em cada momento, esta dialética objetivamente inevitável da história humana; de uma parte, utilizando as épocas de estancamento político ou da chamada evolução “pacífica”, que marcha a passo de tartaruga, para desenvolver a consciência​, a força e a capacidade combativa da classe avançada; e, de outra parte, orientando todo esse trabalho de utilização para a “meta final” do movimento dessa classe, capacitando-a para resolver praticamente as grandes tarefas ao chegarem os grandes dias “em que se condensem vinte anos”. (in “Carlos Marx” – Obras Completas – Ed. Cartago – tomo XXI – pg. 71).

Este esforço pela educação do proletariado é, na verdade, muito mais importante do que toda a fraseologia a respeito da derrubada do governo​ e sua substituição por um governo de compromisso cuja composição não se pode precisar, já que as condições para tanto ainda não existem ou estão apenas na dependência de possíveis crises de governo resultantes de contradições no seio das próprias classes dominantes. Afinal, derrubar um governo é apenas um acidente passageiro no grande conflito que se trava e para o qual devemos nos preparar todos, especialmente nós, comunistas, que deveremos tomar parte no combate final, em que se deve expulsar a todos os tiranos e acabar com o poder do capital sobre o trabalho. A falta dessa perspectiva é que leva ao golpismo, à preocupação com os entendimentos exclusivamente de cúpula, à subestimação do trabalho de massas e do esforço permanente no sentido de ganhar as massas para as posições revolucionárias da vanguarda.

“Passou o tempo dos golpes de surpresa​ – escreveu Engels -, das revoluções executadas por pequenas minorias conscientes​ a frente das massas inconscientes. Onde quer que se trate de transformar completamente a organização da sociedade, cumpre que as próprias massas nisso cooperem, que já tenham elas próprias compreendido do que se trata, o motivo​ pelo qual dão seu sangue e sua vida. Isto é o que nos ensinou a história dos últimos cinquenta anos. Mas para que as massas compreendam o que é necessário fazer é mister um trabalho longo e perseverante”. (in “Introdução às lutas de classes na França de 1848 a 1850”, Marx e Engels – Obras Escolhidas – Ed. Vitória – tomo I – pg. 106).

16. Em conclusão: ao interpretarmos o trecho da Resolução Política do VI Congresso inicialmente transcrito, não podemos deixar de partir da compreensão de que o objetivo imediato dos comunistas na atual etapa da revolução em nosso país é a conquista de um governo revolucionário, o poder estatal das forças antiimperialistas e antifeudais. Na luta por esse objetivo, a tarefa tática consiste agora em lutar pelas liberdades democráticas, pelo isolamento e derrota do atual regime político. No processo dessa luta é possível chegar a uma situação revolucionária que leve à substituição da ditadura por um governo revolucionário, um regime político efetivamente democrático, capaz de tomar medidas contra o imperialismo e seus agentes internos. Os comunistas lutam por que isso aconteça. Mas é possível também (e talvez mesmo bastante provável) que, sem haver ainda uma situação revolucionária, surjam no país condições concretas que tornem viável e necessário colocar na ordem-do-dia o problema do poder para a frente única das forças antiditatoriais. Trata-se, portanto, de uma possibilidade​, que se dará na emergência de uma crise de governo ou mesmo de uma crise política, sem que existam, porém, condições de uma crise revolucionária. Os comunistas – como se diz na Resolução Política do VI Congresso – “participarão (no entanto junto com as demais forças que se opõem ao atual regime da luta pela constituição de um governo das forças antiditatoriais”. Quer dizer: essa ​possibilidade surgirá em situação concreta definida, quando a correlação de forças seja tal que os comunistas possam estar seguros de que terão no governo das forças antiditatoriais completa independência de ação para seu Partido.

​Se a correlação de forças não garantir essa independência, a posição a adotar pelos comunistas é outra e está bem explicitada no mesmo parágrafo da resolução Política do VI Congresso: A atitude dos comunistas, diante de qualquer outro governo intermediário, dependerá da “conjuntura concreta, etc.”, com a conclusão, bastante esclarecedora de que, “participando ou não de tais governos, os comunistas prosseguirão na luta por seus objetivos programáticos”, quer dizer: ​prosseguirão na luta pela conquista de um governo revolucionário, ou efetivamente democrático.

xxx

Cabe, pois, ao Comitê Central decidir se, a pretexto da tática, devemos, em nossa agitação e propaganda, nos referirmos ​exclusivamente às reivindicações imediatas mobilizadoras das massas, a plataforma unitária da frente única antiditatorial e a luta por um eventual governo das forças antiditatoriais; ou se devemos utilizar a agitação e propaganda igualmente (e, em alguns casos, principalmente, para levar ao conhecimento da classe operária e seus aliados o programa revolucionário, antiimperialista e antifeudal, de nosso Partido e a necessidade de lutar, independentemente dos compromissos que possamos realizar com as demais forças antiditatoriais, pela conquista de um governo revolucionário, capaz de dar início à aplicação daquele programa.

Em 8 de abril de 1969.

Antônio Almeida.​

Um comentário em “Luiz Carlos Prestes – Carta ao Comitê Central do PCB

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