Magda Portal – Mulher

Poema originalmente publicado no site Aullido.

Tradução por Ísis Leites.


Mulher de ásperas mãos… vastas mãos
pintadas com veias e varizes
para quem amanhece antes da alvorada
para quem a fadiga nunca acaba
mulher que carrega sempre, resignada,
iluminadas vidas ao azar
sem rima ou razão
sem pão debaixo do braço
nem caminho traçado

para você não fazem elogios
nem cinemas de luxo
seu jardim é a terra
as avenidas sem pavimento
as ruas sem calçada
com poças malcheirosas
onde as crianças brincam
e brigam
e jogam bola com panos sujos
e onde às vezes anoitece cedo
porque nem o Sol quer iluminar um pouco mais
para suprir a iluminação artificial
que não existe em seu bairro

Às vezes você sonha
Como será uma casa limpa?
a comida quente… sem apuros
a melhor cadeira
para que te sentes sem que ninguém te tire
sem que ninguém te obrigue a levantar
e vencer seu cansaço
para ir servi-los?

Como será não ouvir os gritos temperamentais
do marido ou dos filhos
exigindo
cobrando
bufando
xingando?

Não… ninguém tem que saber
que você pensa nisso às vezes
que às vezes tens um estranho brilho
nos olhos opacos e insones
que vêem ao longe vislumbrando distâncias

Rompendo os muros
de sua vivência sem horizontes
onde talvez o ar seja só seu
o ar para respirar com peito cheio
e talvez o mar… talvez
o mar tão longe!

Magda Portal, 1975
De “Poesía interdicta” (Obra inédita, 1965 – 1988)

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