Thomas Sankara – Mensagem ao Congresso Mundial de Prostitutas

Originalmente disponível em francês no site Thomas Sankara.

NOTA REDAÇÃO: Publicamos abaixo três documentos datados do ano 1986. Tratam-se de correspondências entre Thomas Sankara e um congresso mundial de prostitutas, e em seguida uma carta de de Joséphine Ouedraogo, então ministra do desenvolvimento familiar e da solidariedade nacional ao comitê de direitos civis das prostitutas afim de estabelecer contatos entre seu ministério e esse comitê. A revolução baniu a prostituição e tentou promover a reinseração das prostitutas. Contamos com os atores deste período para que possamos concluir esta série de documentos sobre esta questão.

Tradução por Giulia Toledo.


Telex enviado por Thomas Sankara ao congresso mundial de prostitutas, em 2 ou 3 de outubro de 1986

Nós tomamos conhecimento, com respeito e admiração, acerca da realização do segundo congresso mundial de prostitutas.

Nós saudamos esta iniciativa e as felicitamos por olharem para esta questão importante.

Nosso ponto de vista é que a prostituição não é nada além de um produto das injustiças sociais e da filosofia de exploração que conduzem sociedades à degeneração.

É por esta razão que no Burkina Faso, nós combatemos a prostituição – mas nossa estratégia nos imputa a obrigação de destruir a doença sem destruir o doente – ou seja, eliminar a prostituição enquanto se protege a prostituta.

Sim, para nós no Burkina Faso, a prostituta não é mais que uma vítima inocente das sociedades transformadas em selvas, onde se utiliza de tudo para viver, e por vezes, para simplesmente sobreviver.

A prostituição é o roubo organizado da graça da mulher, é a exploração selvagem dos corpos alheios. É a exploração dos seres humanos pelo sistema de poder de compra.

No Burkina Faso, nós lutamos para oferecer às prostitutas empregos que as libertem da exploração alheia e lhes permitam florescer e recuperar sua dignidade e seus direitos.

Nós temos que afirmar que nesta luta permanente, o Burkina Faso adquiriu uma experiência que gostaríamos de compartilhar com sua comunidade reunida.

E se um dia, em um ímpeto de expansão, vocês se unirem às irmãs da África, nós nos disponibilizamos para abrigar outros encontros.

Todos os direitos se conquistam e não é senão pela luta persistente que vocês conquistarão o direito de estarem livres dos métodos policialescos e assediadores que buscam marginalizá-las e limitá-las a simplesmente buscar na resignação quaisquer paliativos para organizar e proteger o que as sociedades injustas desejariam hipocritamente apresentar como seu trabalho.

Vocês não têm direito à rendição.

Vocês não têm direito à desistência.

Pleno êxito ao seu congresso,

Thomas Sankara

A resposta do Comitê de Direitos Civis das Prostitutas a Thomas Sankara

Bruxelas, 3 de Outubro de 1986

À atenção do senhor presidente do conselho nacional da revolução, presidente do Burkina Faso, chefe do governo, capitão Thomas Sankara,

Senhor presidente,

Participando do segundo congresso internacional de prostitutas que se realiza neste momento em Bruxelas, em nome do comitê de direitos civis para as prostitutas italianas, tomamos conhecimento da mensagem de apoio à nossa iniciativa que você teve a amabilidade de nos enviar.

Em primeiro lugar, permita-nos agradecê-lo do fundo do coração por esse gesto sem precedentes que atesta novamente – como se fosse necessário – o papel propulsor que, sob seu impulso, o Burkina Faso assume no desenvolvimento dos direitos da mulher africana, e em definitivo, de todas as mulheres do mundo.

Tendo acompanhado atentamente os esforços desenvolvidos pelo seu governo nesta direção, em nome de todas as nossas colegas, temos profundo interesse em estabelecer contatos regulares com as responsáveis que nos queira indicar, afim de conhecer melhor as respectivas circunstâncias, de um lado e do outro, que nos permitam examinar em conjunto as soluções mais apropriadas para dar um fim à exploração das mulheres e ao desrespeito de seus direitos.

Um esforço conjunto poderia nos permitir, de fato, divulgar melhor em nossos países a terrível condição de inúmeras mulheres africanas forçadas à prostituição por um sistema social que veio das profundezas do tempo e se aperfeiçoou sob o colonialismo, que retira das mulheres qualquer direito real, incluindo o de poder dispor livremente de seus corpos sem a restrição de dinheiro.

Como acredito que nenhum contato real foi estabelecido entre nossas organizações e as prostitutas dos países africanos, nós ousamos esperar que através de sua mediação, isso possa se realizar no Burkina Faso, primeira etapa de uma série de contatos, que a justamente a partir do seu país seriam capazes de unir os esforços de todos nós e nos permitir, se possível propor, que nosso próximo congresso tome lugar exatamente na África, o que também daria à nossa iniciativa uma repercussão espetacular.

Ao renovar nossos sentimentos de gratidão e estima, acredite, senhor presidente, na garantia de nosso profundo respeito.

Pelo comitê de direitos civis das prostitutas,

Carla Corse Pia Covre

Carta de Joséphine Ouedraogo, Ministra do Desenvolvimento Familiar e da Solidariedade Nacional ao Comitê de Direitos Civis das Prostitutas

Ouagadougou, 1º de dezembro de 1986

A Ministra do Desenvolvimento Familiar e da Solidariedade Nacional

ao Comitê de direitos civis das prostitutas

Assunto: Pesquisa de informação

Em resposta ao seu telex, datado de 3 de outubro de 1986, endereçado ao Camarada Presidente do Faso, e em nosso esforço de buscar soluções ao conjunto de problemas ligados ao desenvolvimento da mulher no geral e da prostituta no particular, venho por meio desta correspondência estabelecer um primeiro contato entre o seu comitê e o meu departamento, trabalhando pela mesma causa.

De fato, o ministério do Desenvolvimento Familiar e da Solidariedade Nacional trabalha pela reabilitação dos grupos desfavorecidos, sua reinserção social e a responsabilização do povo burkinabê no cumprimento desta missão.

Para melhor definir as orientações do seu Comitê, eu agradeceria se nos enviassem a documentação relativa ao Comitê e à carta mundial das prostitutas.

Peço-lhes que acreditem na profunda gratidão por sua colaboração!

PÁTRIA OU MORTE, VENCEREMOS!

Joséphine Ouedraogo

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